Topo

Sessão de gala de "Aquarius" em Cannes tem protesto no tapete vermelho

Thiago Stivaletti

Colaboração para o UOL, em Cannes (França)

17/05/2016 10h42Atualizada em 17/05/2016 22h51

A sessão de gala de "Aquarius", filme brasileiro que concorre à Palma de Ouro no Festival de Cannes 2016, foi marcado nesta terça-feira (17) por protestos contra o governo interino de Michel Temer. A exibição também agradou os presentes que aplaudiram o filme por sete minutos. Elenco e o diretor Kléber Mendonça Filho deixaram o Palácio dos Festivais emocionados. 

Ao chegar ao topo da escadaria que leva ao Palácio dos Festivais, o diretor Kléber Mendonça Filho, os atores Humberto Carrão e Maeve Jinkings e outros integrantes da equipe mostraram cartazes com frases em inglês e francês com dizeres como "O mundo não pode aceitar este governo ilegítimo", "Um golpe está acontecendo no Brasil", "54.501.118 de votos foram queimados", "Misóginos, racistas e impostores como ministros", e "Dilma, vamos resistir com você". 

Um dos presentes abriu sua camisa para deixar à mostra uma camiseta com a frase "Super Dilma", em referência à presidente Dilma Rousseff, afastada neste mês de seu cargo no âmbito da abertura de um julgamento de impeachment, denunciado por ela como um "golpe de Estado". Pouco antes da exibição, a câmera do festival filmava Sônia Braga e alguém posicionou um pequeno cartaz atrás dela: "Salvem a democracia brasileira"

Ainda no topo das escadas, Thierry Fremaux, diretor do festival, fez uma pausa no protocolo e pediu que a equipe do evento filmasse os cartazes.

Durante a passagem pelo tapete vermelho, outros convidados e membros da equipe também empunharam cartazes com frases como "Nós resistiremos", "O povo não pode aceitar um governo ilegítimo", e "O Brasil não é mais uma democracia". Depois da entrada na sala de exibição, os convidados do filme estenderam uma faixa com a frase "Stop the coup in Brazil" (parem o golpe no Brasil).

Na sala de imprensa do festival, jornalistas que acompanhavam o evento por um telão aplaudiram em apoio.

"Aquarius", dirigido por Kléber Mendonça Filho ("O Som ao Redor"), é protagonizado por Sonia Braga como uma crítica de música aposentada que trava uma disputa contra um empresário que quer demolir seu prédio, último de seu estilo em Boa Viagem, no Recife, para construir um novo empreendimento.

Artistas protestam

Mais cedo, o cineasta e a atriz já haviam falado sobre o assunto à agência AFP. "O que está acontecendo é um golpe de Estado", disse o diretor. 

"Eu moro nos Estados Unidos, mas também no Brasil, tenho família e amigos lá e penso que o que está acontecendo, a manipulação da tomada do poder, tem que ser exposto ao mundo inteiro", afirmou a atriz, que passa a maior parte do ano em Nova York. "Uma das coisas que mais me preocupa é como o Brasil está dividido. Nunca havia visto o meu país tão dividido", disse.

Em entrevista ao UOL, a atriz Maeve Jinkings, que vive a filha de Sonia no filme, também juntou-se ao grupo expressivo de atores, diretores e produtores que protestam, dentro e fora do festival, contra a nova situação, especialmente a fusão do Ministério da Cultura com o da Educação.

“É um paradoxo tão grande estar em Cannes representando o cinema nacional nesse momento", afirma. "Existe um trabalho colossal por trás dessa seleção do filme em Cannes. O cinema só está produzindo uma média de 130 longas por ano porque tivemos leis de incentivo”, defende. “Na última vez em que sofremos um grande baque, na era Collor, produzimos um ou dois filmes por ano apenas. Não podemos nunca voltar a isso”.

Assim como a maior parte da produção cinematográfica brasileira --que segue modelo próximo ao de países como a França, que tem pesados subsídios para o cinema local--, "Aquarius" foi financiado através da Lei do Audiovisual --lei de fomento que autoriza projetos a captarem recursos junto à iniciativa privada, que em contrapartida pode descontar parte desse patrocínio do imposto de renda devido--, que autorizou a produção a captar R$ 2,9 milhões, além de editais como o do BNDES, através do qual o filme recebeu R$ 1 milhão do banco estatal.